quarta-feira, 19 de outubro de 2011

Guimarães em Tempo de Guerra XI


No meu último artigo, citava o escritor vimaranense Costa Freitas para pôr como hipótese do início da revolta popular da Maria da Fonte freguesias do concelho de Guimarães (S. Torcato, Balazar, Sande e Fermentões). Mas, para esta crónica, mais importante do que tentar descortinar o local onde a revolta teve início é tentar saber quais foram as consequências que a Maria da Fonte trouxe a Guimarães. Como já referi, a antiga ponte de Santa Luzia, então às portas de Guimarães, terá sido o local onde se sentiram os primeiros confrontos entre as «autoridades» e o «povo». Contudo, a escaramuça não terá tido consequências muito graves, visto que o Administrador do Concelho, João de Oliveira Cardoso, com alguns Cabos de Polícia conseguiu por cobro aos tumultos. Relativamente perto de Guimarães, no concelho de Vieira do Minho, há algum tempo que as mulheres andavam indignadas, juntando-se em grupos armados de paus e foices roçadouras. A causa da indignação era, fundamentalmente, o peso dos novos impostos (o povo chamava aos impressos dos impostos «bilhetas») a que se juntava a proibição de enterrar os mortos dentro das Igrejas. No fundo, como se verá adiante, eram alguns aspectos da implantação do liberalismo que estavam em causa e a incapacidade de uma parte considerável da população para os compreender e aceitar. É neste contexto que surge um dos principais guerrilheiros da época, o Padre Casimiro José Vieira. Ao chegar junto à Casa da Administração de Vieira do Minho e ao ver homens e mulheres a destruírem uma serie de papéis (queriam destruir as «bilhetas» dos impostos), o Padre Casimiro ficou apreensivo. Achava que a populaça estava certa nas suas reivindicações, mas não queria ver toda a documentação da Administração destruída de forma aleatória. Decidido a impedir que o caos se instalasse, toma uma decisão – de forma muito consciente – que iria mudar a sua vida: pega num «pau de fogo» e queima os «papéis da (…) desgraça». Ao tomar esta atitude, o Padre Casimiro torna-se, naturalmente, o líder dos revoltosos naquela região. Com o passar do tempo e depois de uma serie de peripécias, o Padre Casimiro começava a consolidar o seu poder e tinha já sob o seu comando um bando de revoltosos. Ao crescente poder do Padre Casimiro responderam as autoridades com uma ordem de prisão. Audacioso, o Padre não cederia e tentaria prender os homens do Regimento 13 que o tinham tentado prender.

Os motins populares começavam a ganhar a forma de uma nova guerra civil e, sem grande margem para dúvidas, o Padre Casimiro José Vieira era um dos principais líderes dos revoltosos. Comandava ataques a alvos pré-determinados e um deles foi à «tropa» aquartelada em Guimarães. Nas suas memórias, o Padre Casimiro descreve assim o sucedido: «resolvemos (…) atacar a tropa a Guimarães (…). Reparti-lhes a pólvora que tinha recebido (…) e depois de ouvirmos missa por ser dia santificado, marchamos pelas onze horas para Guimarães. Determinei que os [povos] de Fafe descessem pelo convento da Costa e atacassem primeiro, principiando a bater fogo pelo sul, os de S. Torcato, que estavam postados na Madre Deus, em seguida pelo norte, os das Taipas que vinham por Santa Luzia, pelo poente e eu marchei pelo centro (…) direito ao Cano. (…) Os guerreiros de Fafe meteram-se dentro do convento da Costa (…) e de lá começaram a fazer fogo pelas janelas, contra as ordens que eu havia dado e, por mais que lhes fizesse sinal para descerem a Guimarães, não fui capaz de os desentocar dali (…) tal era a coragem destes valentes!! E o mesmo aconteceu com os [homens] de S. Torcato! Vi-me obrigado a [disparar] contra o castelo [mas] como a posição em que me [pus] estava a descoberto, começaram a cruzar ali as balas sobre nós (…). Terminado o fogo retiramos para S. Torcato (…)».

Findo este episódio, o Padre Casimiro voltaria a Vieira do Minho, andaria pelo Bom Jesus, Braga, Póvoa de Lanhoso e, algum tempo depois, voltaria a entrar em Guimarães, para negociar com o Visconde da Azenha e com o Barão de Almargem, membros da Junta Revolucionária que se tinha formado em Guimarães (curiosamente o Barão e o Visconde eram de facções políticas opostas).

Antes de chegar a Guimarães, o Padre Casimiro pernoitou nas Taipas. Aí, influenciado por um padre amigo, assumiria um «título» pelo qual passaria a ser conhecido: Padre Casimiro José Vieira, «Defensor das Cinco Chagas e Comandante Geral das Forças Populares do Minho e Trás-os-Montes».

Em Guimarães, as coisas não correram bem entre o Padre Casimiro e o Barão de Almargem visto que estes dois homens tinham «sentimentos [políticos] diametralmente opostos». Pouco tempo depois o «Defensor das Cinco Chagas» voltaria para atacar Guimarães. (continua).

(imagem: retrato do Padre Casimiro José Vieira)

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