terça-feira, 6 de dezembro de 2011

Seria o dia de S. Nicolau celebrado na Universidade da Costa?

Os estatutos das universidades portuguesas dos séculos XVI e XVII determinavam que o dia de S. Nicolau (6 de Dezembro) fosse dia de “préstito” (espécie de procissão) ou de “vacações” (férias). Na Europa, durante a Idade Média, o dia de S. Nicolau revestia-se de grande importância para os estudantes que, nessa data, participavam em procissões dedicadas ao Santo e faziam grandes folias. Em Portugal o dia de S. Nicolau era assinalado na Universidade pelo menos desde o início do século XVI. Em 1537, após a transferência da Universidade de Lisboa para Coimbra, o dia de S. Nicolau continuou a ser celebrado pelos estudantes. Nos estatutos da Universidade de Coimbra de 1593 o dia de S. Nicolau aparecia consagrado como dia de préstito em que “se irá [ao colégio de] S. Jeronimo ”.

O facto de todos os estatutos universitários portugueses do século XVI referirem o dia de S. Nicolau como dia de festa ou de “préstito” diz-nos ser provável que na Costa também se prestasse culto ao referido santo. A “tradução-resumo” dos estatutos da Universidade da Costa (os estatutos desenvolvidos, a terem existido, encontram-se desaparecidos) indica, em certo artigo, que o funcionamento da Universidade da Costa era idêntico ao de outros colégios universitários seus contemporâneos, como se pode depreender da leitura do seguinte ponto dos estatutos: “que o dito colégio e colegiais dele (...) gozem de todos e quaisquer privilégios isenções, liberdades, graças e indultos que há na mesma ordem, mosteiros, casas e colégios dela nos reinos de Portugal, Castela ou Aragão (...) e assim de outras ordens e seus colégios e pessoas deles pelo tempo que geralmente forem concedidos”. Assim sendo parece quase certo que o dia de S. Nicolau, um dos dias mais simbólicos para os estudantes do século XVI, fosse celebrado na Costa. A isto deve acrescentar-se também que S. Nicolau era particularmente venerado pelos mestres e alunos de Artes, curso que foi ministrado na Universidade da Costa entre 1537 e 1550. Como já foi dito em artigo anterior, o próprio Reitor da Universidade da Costa e professor de Artes, Frei Diogo de Murça tinha uma particular veneração pelo Santo.

Através leitura das Constituições do Colégio de Santa Cruz de Coimbra, datadas de 1537 (ano em que foi fundado o Colégio da Costa) é possível perceber que o culto a São Nicolau estava bem enraizado neste tipo de colégios. A leitura reveste-se de particular interesse se percebermos que tanto o Colégio de Santa Cruz como o Colégio da Costa parecem ter sido pensados de forma muito semelhante. Funcionavam seguindo o modelo da Universidade de Paris, reflectindo, em certa medida, o percurso académico dos seus reitores/reformadores que em tudo era idêntico. Na Costa era Reitor Frei Diogo de Murça (monge Jerónimo, estudou em Salamanca, Paris e Lovaina, onde se doutorou em Teologia) e em Santa Cruz a reforma dos estatutos foi feita por um condiscípulo de Frei Diogo de Murça, Frei Brás de Braga (monge Jerónimo, estudou em Paris e Lovaina onde se doutorou em Teologia). Os estatutos do colégio de Santa Cruz reflectem o espírito humanista da época e as influências parisienses de Frei Brás de Braga. No ponto relativo ao “tempo em que há vacações” é apontado, entre outros, o dia de S. Nicolau em que os estudantes, tal como acontecia noutros dias de férias, podiam para “além da espiritual (...) tomar alguma humana recreação”. Tal como o Colégio da Costa, o Colégio de Santa Cruz pretendia ser um centro de pedagogia moderna e humanista e tudo parece indicar que a sua forma de governo fosse semelhante.

A conjugação de todos estes factores, leva-me a afirmar com um elevadíssimo grau de probabilidade que, entre 1537 e 1550, o dia de S. Nicolau foi celebrado na Universidade da Costa.


Fontes: A Universidade de Guimarães no século XVI" de A. Moreira de Sá (1982)

"O S. Nicolau dos Estudantes" de A.L. de Carvalho (1956)

O Instituto : jornal scientifico e litterario Vol. 38 pp. 310 - 318

Ver tb. links indicados no texto.

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